Do lixo ao turismo: o banco de dados que conecta o que acontece na areia, no mar e na economia de Itamaracá

Um novo banco de dados sobre Itamaracá conecta contagens de lixo, comportamento de turistas e variáveis meteo-oceanográficas, permitindo que gestores, comunidades e pesquisadores enxerguem as relações entre poluição, economia e natureza, e planejem intervenções costeiras mais inteligentes.

Praia, lixo, costeira
O lixo acumulado na faixa de areia evidencia o desafio contínuo da poluição costeira enfrentado por praias ao redor do mundo.

Quando olhamos para uma praia, vemos muito mais do que sol e areia: há lixo que chega com as ondas, turistas que deixam pegadas (e copos descartáveis), marés que sobem e descem e ventos que espalham tudo isso. Entender essa mistura é um desafio que pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e do Leibniz Institute for Baltic Sea Research, na Alemanha, decidiram encarar criando um banco de dados inédito sobre a Ilha de Itamaracá, em Pernambuco.

O conjunto reúne mais de 6 200 registros coletados em 2022, do tipo e quantidade de lixo encontrado em transectos de 25 m à ocupação de hotéis, ando por vento, onda, chuva e até a aparência cênica das praias.

Tudo está organizado em um banco relacional PostgreSQL, com scripts abertos no GitHub, pensado para que qualquer pessoa cruze informações num clique e formule novas perguntas sobre poluição marinha, turismo e gestão costeira.

Por que integrar dados tão diferentes?

A poluição de praia não nasce apenas do descuido de quem deixa lixo na areia. Ela reflete padrões de consumo, dinâmica turística e forças naturais que transportam resíduos. Ao reunir variáveis ambientais, sociais e econômicas no mesmo período e local, o banco permite responder questões impossíveis de investigar com bases isoladas, como: “Há mais plástico em dias de maré alta ou em feriados prolongados?”

Principais camadas integradas:

  • Lixo em praia e em wrack (aglomerados de algas e detritos) coletado e classificado segundo a ONU;
  • Uso da praia, avaliado pelo aplicativo BeachLog e por um checklist de paisagem costeira;
  • Dados de hospedagem (taxa de ocupação, diária média e tempo de estadia) captados via Google Maps e AirDNA;
  • Variáveis meteo-oceanográficas de maré, vento, onda e precipitação geradas por modelos da NOAA e pela Marinha do Brasil;
  • Validação por curvas de acumulação, mostrando que as coletas capturaram mais de 90 % das categorias de lixo visíveis.

Como o banco foi construído em Itamaracá

Integrar tudo num só lugar produz respostas mais rápidas e sólidas. Gestores municipais podem cruzar picos de ocupação hoteleira com volumes de lixo e programar mutirões de limpeza nos dias certos; ONGs conseguem apontar, com evidências, se a proibição de embalagens plásticas em barracas reduziu a quantidade de copos descartáveis na faixa de areia; pesquisadores podem calibrar modelos que relacionem direção de vento e deposição de microplásticos.

lixo, praia, nordeste
Integrar dados de lixo, turismo e meteo-oceanografia transforma essa paisagem em laboratório vivo para planejar limpezas, políticas públicas e turismo sustentável.

Depois da coleta, os pesquisadores criaram oito tabelas ligadas (praias, detalhes da amostragem, lixo na areia, lixo em wrack, variáveis oceânicas, uso da praia, acomodação e hotéis).

Scripts em Python automatizaram o carregamento das planilhas para o banco, mantendo nomes de coluna padronizados e um dicionário de dados para facilitar a vida de futuros usuários. Esse cuidado torna o conjunto reaproveitável em modelos preditivos, governos locais ou iniciativas de ciência cidadã.

O que isso muda para praias e pessoas

Integrar tudo num só lugar produz respostas mais rápidas e sólidas. Gestores municipais podem cruzar picos de ocupação hoteleira com volumes de lixo e programar mutirões de limpeza nos dias certos; ONGs conseguem apontar, com evidências, se a proibição de embalagens plásticas em barracas reduziu a quantidade de copos descartáveis na faixa de areia; pesquisadores podem calibrar modelos que relacionem direção de vento e deposição de microplásticos.


O banco de Itamaracá mostra que a ciência pode, e deve, conversar com quem visita, mora e governa as praias. Ao conectar lixo, turismo e oceanografia, ele transforma planilhas em histórias que qualquer pessoa entende: histórias sobre o caminho que um canudinho faz até o mar, o impacto econômico de uma praia suja e as oportunidades de mudança quando todos têm o à mesma informação.

Referência da notícia

A dataset that integrates Beach Litter, Beach Uses, and Coastal Oceanographic variables. 11 de junho, 2025. De Ramos, B., da Costa, M.F.